sábado, 7 de julho de 2012

It hasn’t happened yet, de William Shatner

William Shatner – “Audaciosamente indo”
ao universo da música

O ator William Shatner, a partir de 1966, ficou conhecido mundialmente como o capitão James T. Kirk do seriado Jornada nas Estrelas. Seu trabalho no programa de TV e, mais tarde, nos seis filmes de cinema que consagraram Jornada, pode ser considerado o ponto alto de uma carreira muito difícil. De fato, há quem considere espantoso que o ator tenha se mantido “à tona” por décadas, e ainda mais que finalmente, chegando já aos seus setenta anos de idade, tenha conquistado o que parece ser uma posição definitiva de ícone do showbiz, com sua interpretação do advogado fanfarrão Denny Crane no seriado Boston Legal, e... sua segunda incursão na música, com um disco de canções faladas focado principalmente em suas experiências de vida, intitulado de forma cômica e desafiadora Has been – palavras que podem ser entendidas como a descrição de alguém que “passou da validade”.

Shatner, que se aventurou em todos os ramos do mundo do entretenimento – além de atuar, ele dirigiu, produziu, publicou romances, foi entrevistador em talk shows de rádio e TV –, realizou em 1968 um álbum de letras faladas (o caminho que encontrou para utilizar musicalmente uma voz impactante, que todavia não é a de um cantor), que consiste quase todo em interpretações de uma grande variedade de obras, desde monólogos shakespearianos até o clássico Lucy in the sky with diamonds, dos Beatles. O imenso descrédito com que o disco foi recebido, inclusive o fato de a interpretação de Lucy... ter sido eleita a pior de todos os tempos, tudo isso como resultado sobretudo do tom (algumas vezes, involuntariamente) engraçado que o ator conferiu ao álbum, pareceu encerrar em definitivo suas pretensões como músico. Entretanto, Has been, lançado em 2004, mostrou ter um destino totalmente diferente, pois recebeu diversas críticas entusiasmadas, tanto pelos arranjos instrumentais muito bem feitos como também pelas letras, que desta vez foram quase todas escritas pelo próprio cantor. E, embora o termo “cantor”, aplicado a ele, continue sendo apenas força de expressão, desta vez a qualidade de sua performance não pode ser negada, em discursos que em sua maior parte consistem em dramáticas confissões pessoais e apenas em algumas faixas voltam a um tom (genuinamente) engraçado.

Assim, nas faixas sérias do disco, Shatner fala de problemas tão íntimos como sua dificuldade de relacionamento com a filha (That’s me trying – Este sou eu tentando); ou a descoberta terrível, quando voltou para casa numa noite, do corpo de sua terceira esposa – que ele já sabia ser alcoólatra quando se casaram, e que acabou cumprindo suas ameaças de cometer suicídio (What have you doneO que você fez); ou, enfim, suas inseguranças pessoais e profissionais, que parecem acompanhá-lo até hoje e continuam adiando a realização de uma verdadeira felicidade (It hasn’t happened yetIsto não aconteceu ainda).

Mas preciso esclarecer que não ouvi o disco inteiro; os comentários feitos aqui têm base em diversas críticas que li na internet – que vão desde uma agradável surpresa até uma afirmação convicta de que o álbum pode ter sido o melhor lançamento de 2004. Mas minha opinião também é motivada por algumas faixas que já escutei, e que tenho certeza que são amostras significativas da qualidade do conjunto: p.ex., That’s me trying, muito bonita, e It hasn’t happened yet, que foi responsável por me tornar de imediato um fã deste “cantor”. Podem-se ressaltar dois detalhes especiais desta canção: primeiro, o trecho onde Shatner vê a si mesmo escalando uma montanha – referência a uma sequência de Jornada nas Estrelas V –, e segundo, o acompanhamento de uma maravilhosa cantora, que contribui em muito para a música realmente “decolar”.

Enfim, boa sorte nas “contínuas viagens” do velho capitão!

It hasn’t happened yet, de William Shatner


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